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ESPOSO DE UMA SÓ MULHER



O que significa a frase “esposo de uma só mulher” em 1 Timóteo 3:2 e 12, Tito 1? Nos preceitos de Paulo para a liderança da igreja de Cristo aparece três vezes a ordem para que o líder espiritual (bispo, presbítero e diácono) seja esposo de uma só mulher. O que significa este mandamento? Vejamos algumas possibilidades: 

1.    Que ele seja casado
Exigir que um homem seja casado para ter condições de assumir uma função de liderança na igreja parece ser uma interpretação menos provável, mas merece ser apreciada visto que muitas igrejas a tomam como mandamento para a não ordenação de pastores, presbíteros e diáconos solteiros.
Esse requisito é compreendido como uma exigência muito mais social do que espiritual, pois um homem solteiro está destituído da experiência de cuidar de uma família, o que o torna menos experiente para o aconselhamento, por exemplo. Um homem casado, afirmam alguns, desenvolve aspectos como paciência, compaixão, o que pode lhe dar uma condição melhor em boa parte do seu ministério. Como uma pessoa pode governar a igreja de Deus se não tem a experiência de governar um lar? Perguntam.
Tais argumentos, conquanto importantes, parecem improváveis para assegurar que ser esposo de uma só mulher signifique a obrigatoriedade do líder ser casado. Se fosse esta interpretação o mesmo deveria também ter filhos, que aparece na sequência do texto (1 Tm 3.4 e 5). Além disso, Paulo se apresentou como solteiro sem nenhum constrangimento, (1 Co 7.7-8) e destacou, pelo menos uma vez, as vantagens de um ministério destituído das preocupações do casamento (1 Co 7.8,32-35).
Stott, que exerceu todo o seu ministério como solteiro tem autoridade o suficiente para as seguintes palavras:
Certamente, Paulo presume que os pastores normalmente se casem, e sem dúvida a experiência do casamento e da vida familiar é algo que em muito contribui para o exercício do ministério. Entretanto ele não está pretendendo desqualificar aqueles dentre nós que são solteiros.
Ainda que seja preferível que os presbíteros e diáconos sejam casados, os textos em análise não parecem indicar este caminho. Caso fosse a igreja teria perdido a oportunidade de receber a ministração de homens e mulheres que muito a abençoaram durante toda a sua história. O celibato, por sua vez pode ser um dom (1 Co 7.7), sendo assim, quem o tiver deverá ter a mesma oportunidade de servir que os demais.

2.    Que ele não seja polígamo:
Uma possível interpretação é que um líder espiritual não pode ser polígamo, ou seja, não pode ter mais do que sua própria esposa.
Calvino caminhou nesta direção com o seguinte comentário:
Minha interpretação pessoal é simples: Paulo está proibindo aos bispos a prática da poligamia por ser ela o estigma de um homem impudico que não observa a fidelidade conjugal...Porquanto o decreto divino é imutável: “Serão uma só carne (Gn 2.24)”.
O que prejudica este entendimento é o fato de que a poligamia parece que não era comum nas igrejas cristãs, quanto mais entre seus líderes. Não se pode dizer o mesmo da sociedade romana e até no antigo judaísmo, que consideravam a poligamia como algo natural.
Neste sentido, Stott nos ajuda com o seguinte pensamento:
Alguns têm defendido essa posição, porque a poligamia, embora oficialmente proibida pela lei romana, era ainda amplamente praticada e tolerada pela cultura judaica. Por exemplo, em seu Diálogo com Trifo, um Judeu, Justim Martir, um apologista cristão do segundo século, escreveu mencionando mestres judeus” imprudentes e cegos, que até agora permitem a um homem ter quatro ou cinco esposas”.
E continua.
Parece não haver evidência alguma quanto aos cristãos terem praticado a poligamia. Além disso, a exigência complementar de Paulo, ao dizer que a viúva, para ser incluída na lista de viúvas, deveria ter sido esposa de um só marido, teria então que ser entendida como se referindo à poligamia, sendo que disso não se tem notícia nem mesmo entre os pagãos.
A poligamia era claramente proibida pelas Escrituras (Gn 2:24), pelo ensino de Jesus (Mt 19:5, 6; Mc 10:6-9) e pelo de Paulo (Ef 5:31). Um polígamo sequer poderia ser membro da igreja, muito menos ser líder de uma. Neste sentido esta recomendação de Paulo aos bispos, presbíteros e diáconos não teria, originalmente, a intenção de proibi-la.
Em algumas culturas, no entanto, para que não haja a prática, entre os membros e até mesmo na liderança, da poligamia, tem se aplicado este texto para a regulamentação da questão, conquanto pareça não ter sido este o propósito original de Paulo ao escrevê-lo. Ter mais do que uma mulher, simultaneamente, seria, segundo a teologia paulina, uma absurdo, o que não mereceria nenhum comentário no que se refere à liderança de uma igreja cristã.
3.    Que ele não seja casado novamente
Nesta interpretação o presbítero ou diácono, em função da necessidade de sua vida irrepreensível (1 Timóteo 3:2), não deve se casar novamente, nem diante do abandono de sua esposa ou mesmo em caso viuvez. Para continuar sendo irrepreensível, argumentam os defensores desta tese, ele deve ser ou ter sido esposo somente de uma só mulher. Ao casar-se novamente ele se torna desqualificado para cuidar com autoridade das famílias da igreja.
John Kelly corrobora com este pensamento:
Embora Paulo permitisse a uma viúva que se casasse de novo, estimava-a mais bem-aventurada se se abstivesse de um segundo casamento (1 Co 7.40)... Assim é natural esperar que os ministros da igreja fossem exemplos a outras pessoas e que se satisfizessem com um único casamento. Nos primeiros séculos cristãos, devemos notar, o segundo casamento não era totalmente proibido, mas era considerado com nítida desaprovação.
Parece que no caso de pastores, presbíteros e diáconos viúvos, a tradição da igreja tem sido no sentido de não colocar nenhum empecilho para um novo casamento e a sua continuidade no ministério da igreja, caso se encontrem irrepreensíveis nas demais áreas relacionadas no texto. Paulo deixa claro que o novo casamento, em caso da morte do cônjuge, ainda que não citando diretamente os líderes, tem a permissão divina (1 Tm 5:14; Rm 7:2-3; 1 Co 7:39). Proibir um líder viúvo de assumir novas núpcias seria uma contradição às suas próprias palavras.
O entendimento de Hendriksen é nesta direção:
Paulo não se opunha ao casamento depois da morte de um dos cônjuges, ainda que, sob certas circunstâncias específicas, ele considerava ser mais prudente continuar no estado de solteiro do que casado. Podemos estar certos de que Paulo estava em completa harmonia com o autor de Hebreus, quando diz: O casamento deve, ser honrado por todos” (Hb. 13.4).
Parece não haver muita dificuldade em se aceitar o casamento de um líder em caso de viuvez, no entanto, quando se trata de presbítero ou diácono divorciados, deve haver mais cuidado na análise do texto, como veremos.
Uma interpretação sugerida é que Paulo estaria proibindo um homem divorciado de servir como líder da igreja, seja como pastor ou presbítero (1 Tm 3.2) e como diácono (1 Tm 3.12). Caso seja isso, durante toda a sua vida o líder deve ser esposo de apenas uma mulher. Caso ele case-se novamente, enquanto a primeira esposa esteja viva, obviamente, ele deixaria de ser irrepreensível, que é uma exigência fundamental para a liderança da igreja cristã e que está diretamente ligada a esta.  Uma compreensão assim pode ser vista em 1 Tm 5.9 onde o mesmo Paulo ressalta a necessidade de uma viúva ter sido esposa de apenas um marido para postular ajuda da comunidade cristã. Ser casada mais do que uma vez a impediria de receber ajuda da igreja.
A interpretação de que uma pessoa vítima do adultério estaria livre para se casar novamente (Mt 19:9; 1 Co 7:15) parece não se aplicar quando se trata da liderança da igreja. As exigências para o episcopado, presbiterato e diaconato são maiores do que para os crentes em geral. Tiago tem esta compreensão ao alertar que a liderança não deve ser assumida sem se analisar o preço a ser pago (Tiago 3.1). O que está em foco é a irrepreensibilidade do líder espiritual no seu relacionamento com a sua primeira esposa. O homem que se divorcia, mesmo em caso de relação sexual ilícita da esposa, e se casa com outra mulher não é mais marido de uma só mulher. Ele não é exemplo dos fiéis e perde a autoridade sobre a igreja de Deus, entendem alguns.
Os presbíteros e diáconos devem ser modelos dos fiéis (1 Tm 4:12), eles devem ser imitados pelos crentes (1 Co 3.15). Eles são observados atentamente (Hb. 13.7) e devem ser, em tudo, irrepreensíveis.
Tedd Tripp faz a seguinte consideração sobre esta irrepreensibilidade do líder:
Uma das qualificações para o ministério do evangelho é ter uma vida familiar exemplar, sendo alguém “que governe bem a própria casa, criando os filhos sob a disciplina, com todo o respeito”. O lar é um microcosmo da igreja. As qualidades da vida espiritual que dão credibilidade ao pastor em casa fornecerão a mesma medida de confiança às pessoas que ele serve na igreja. A vitalidade espiritual que permite sua família seguir com alegria sua liderança assegurará a igreja de que ela está em boas mãos.
Outro argumento comumente usado para a não aceitação de um novo casamento dos líderes da igreja, estando a primeira esposa ainda viva, é visto no relacionamento de Cristo com sua igreja. O casamento é uma bela ilustração da dedicação de Cristo à sua noiva, à igreja. Jesus tem uma única igreja, assim os maridos devem ter uma única esposa caso aspirem a liderança de uma igreja que a Ele pertence (Ef. 5.22-33).
Jesus afirmou que o casamento deve ser mantido e não quebrado, como no início da criação (Gn 2.23, 24; Mt. 19.3-9). A sua ênfase foi na sua preservação, não em sua destituição. O divórcio, destacado pelos contemporâneos de Jesus, não deveria ser visto como uma ordem mas como uma permissão por causa da dureza do coração humano. O perdão e a reconciliação deveriam ser os objetivos principais em caso de pecados dentro do casamento. Os líderes devem ser exemplos nesta área visto que ensinarão sobre este princípio durante todo o seu ministério.
 Enfim, mesmo que haja uma possibilidade para o divórcio e novo casamento de um crente cujo cônjuge tenha sido infiel, tal possibilidade não deve se aplicar aos bispos, presbíteros e diáconos. Estes têm um padrão superior de conduta. Divorciando-se e casando-se novamente eles perdem a irrepreensibilidade diante do rebanho.
Stott, por sua vez, com o equilíbrio que lhe é peculiar, destaca que a proibição de um novo casamento para os bispos, presbíteros e diáconos, pode ser discutida e até imposta, mas não baseada somente nestes textos. Ele faz os seguintes questionamentos:
Será que o divórcio e o novo casamento constituem uma proibição absoluta para a ordenação, embora isso pareça ter sido permitido por Jesus para a parte inocente, quando a outra parte é que foi culpada de um sério pecado sexual, e também por Paulo, no caso de um novo convertido cuja esposa permaneça incrédula, não pretendendo ele manter o casamento? Será que essas concessões, então, não se aplicam ao clero e aos que pretendem nele ingressar? Se não, isso não estaria levantando uma norma dupla?
Em seguida o mesmo Stott, quase que contrariando a frase anterior, adverte para o peso da questão quando se trata de pastores e líderes:
Sim, isso é verdade mas não seria razoável e correto esperar que um nível mais elevado seja prescrito para os pastores, que são chamados a ensinar através do exemplo de sua vida, tanto como com palavras?
Fazendo uma paráfrase do comentário de Stott, do fim para o início poderíamos dizer que: o ideal bíblico é que os líderes espirituais, especialmente os pastores, jamais se divorciassem, e que nutrissem o mais alto grau de santidade em seu casamento e que sua família fosse um exemplo para as demais. No entanto, a Bíblia nos aponta para líderes falhos que foram reabilitados para governar o povo de Deus em circunstâncias especiais. Homens como Abraão, Jacó, Davi, Pedro podem exemplificar que a irrepreensibilidade pode ser readquirida. Eis aqui um grande desafio para a igreja.
4.    Que ele mantenha pureza sexual e moral.

Uma interpretação comum tem sido a de que este texto não esteja falando nada sobre poligamia, divórcio ou segundo casamento, e tão somente da pureza sexual de bispos, presbíteros e diáconos.  O   destaque aqui é que um "marido de uma mulher só" é aquele que é dedicado exclusivamente à sua esposa. O que se frisa é a pureza moral e sexual dos líderes e não o seu estado civil. Perder a pureza é perder irrepreensibilidade para cuidar da igreja de Deus, admitem alguns.
Stott entende que esta é melhor interpretação para o texto. De maneira objetiva afirma:
Paulo está estabelecendo, de forma positiva e em caráter geral, a condição de que um candidato ao pastorado tem de ser “fiel” à sua única mulher, um homem de inquestionável moralidade, alguém que seja verdadeira e fielmente devotado à sua única esposa, ou um homem que, tendo feito a aliança de um casamento monogâmico, seja fiel aos seus votos do casamento. Os que recebem a confiança de estar numa posição de supervisão sobre a igreja, que são chamados para ensinar doutrinas e exercer a disciplina, têm de ter uma reputação imaculada na área de sexo e casamento.
O casamento para o líder deve ser um laboratório para a santidade sexual e a beleza moral. Se ele falhar nesta área perderá a condição de liderar o seu rebanho na mesma direção.
William Hendriksen nos oferece o seu precioso comentário:
Um bispo ou ancião deve ser um homem de moralidade inquestionável, que seja inteiramente fiel e leal à sua única e exclusiva esposa; que, sendo casado, não se põe, segundo o costume dos pagãos, em relação imoral com outra mulher.
Neste pensamento o que se deve observar é que Paulo não está considerando o estado civil, conquanto faça isto em outros textos; a questão aqui é que ele tenha fidelidade e compromisso moral a uma única mulher, a sua esposa, para que seja irrepreensível e apto para ser líder na igreja. Nenhuma outra mulher pode chamar a sua atenção. Ele tem um pensamento e um sentimento exclusivo para a sua esposa.
 A dedicação exclusiva à esposa (e ao marido) pode ser notada também em 1 Corintíos 7.2 onde Paulo diz:
Agora, em relação aos assuntos sobre os quais escrevestes, é bom que o homem se a abstenha de relações sexuais com qualquer mulher. Porém, por causa da imoralidade, cada homem tenha sua própria esposa, e cada mulher, seu próprio marido. O marido deve cumprir seus deveres conjugais para com sua esposa, e, da mesma forma, a esposa para com o seu marido (versão king James).
O mesmo sentido têm as palavras de Gordon:
A preocupação de que os líderes da igreja vivam vida matrimonial exemplar parece ajustar-se melhor ao contexto dada a aparente desvalorização do casamento e da família apregoada pelos falsos mestres (1 Tm 4.3).
Conclusão
Parece não ser possível uma interpretação única do texto conquanto, em linhas gerais e observando o conjunto de outros textos possamos afirmar que:
Não é necessário que um homem seja casado e tenha filhos para exercer o pastorado, presbiterado e diaconato da igreja, no entanto, ao se casar, ele deve ter apenas uma mulher e ser fiel a ela.
Se ficar viúvo ele terá a oportunidade de se casar novamente e continuar no ministério. Se ele, sendo líder, se divorciar, sendo ele o causador do divórcio, não estará mais apto para a liderança da igreja, visto que não seria mais irrepreensível. A ressalva, neste caso, é que há suficientes bases bíblicas para que uma pessoa arrependida, restaurada em sua comunhão com Deus, em circunstâncias especiais, voltar a exercer a liderança da igreja.  Mesmo com esta compreensão é prudente ponderar muito e não impor precipitadamente as mãos, observando o que nos ensina Paulo em 1 Timóteio 5.22. Como bem nos orienta Kostenberger ao refletir sobre esta questão: O ideal é a igreja não nomear divorciados para os cargos de pastor, presbítero ou diácono, especialmente quando há candidatos qualificados disponíveis que não passaram por um divórcio[1]
Caso ele se divorcie, sendo inocente, isto é, que tenha sido alvo de abandono ou de relação sexual ilícita da esposa, deverá ser avaliado pela liderança de sua igreja ou denominação para buscar nele a irrepreensibilidade para a continuidade ou não do seu ministério.



[1] KOSTENBERGER, Andreas J. Casamento e Família, Vida Nova, p.276

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Pr. Luiz César : ESPOSO DE UMA SÓ MULHER
ESPOSO DE UMA SÓ MULHER
Pr. Luiz César
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