É
possível um pregador cristão pregar um sermão inteiro sem falar de Jesus e sua
obra? Acreditem, é possível e acontece com muita frequência.
Todos
nós, em maior ou menor grau somos pregadores, anunciamos a Palavra de Deus e
nos consideramos como embaixadores de Cristo, como se Cristo exortasse por
nosso intermédio (2 Co 5.20). No entanto todo servo de Deus que se apossar da
sua palavra para pregar terá que se aperceber que esta Palavra tem um centro,
um eixo, um sustentador, e este é Cristo. Paulo o descreve como o centro de
todas as coisas em Colossenses
1.15-19:
Este é a imagem do Deus invisível, o
primogênito de toda a criação; pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos
céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam
soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e
para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste. Ele é a cabeça
do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para
em todas as coisas ter a primazia, porque aprouve a Deus que, nele, residisse
toda a plenitude.
Ora,
se Ele em todas as coisas tem a plenitude, deve tê-la também na pregação.
Lloyd-Jones
confidenciou certa vez que uma mudança fundamental ocorreu em sua perspectiva e
pregação no ano de 1929. Certa noite, depois de pregar em Bridgend, South
Wales, o ministro local desafiou-o dizendo que parecia que a cruz e a obra de
Cristo ocupavam um pequeno lugar em sua pregação. Imediatamente ele foi a uma
livraria que vende livros usados e pediu ao proprietário livros que falavam
sobre a expiação, a morte de Cristo e sua obra. Tendo voltado para casa, ele se
entregou totalmente ao estudo, recusando o almoço e o chá, e causando tal
ansiedade à esposa que esta telefonou a seu irmão perguntando se devia chamar
um médico. Porém, ao emergir da reclusão, Lloid-Jones dizia ter encontrado o
verdadeiro coração do evangelho e o segredo do significado interior da fé
cristã” (A Cruz de Cristo – pg. 05 e 06).
Somente
o conhecimento de Cristo pode dar entendimento espiritual para a salvação e
edificação de uma pessoa. É importante que as pessoas vejam a Jesus em nossa
pregação, nas páginas da Bíblia, andando pela Escritura. A fé salvadora não
nascerá em um terreno onde Jesus não tem a primazia.
Esta
foi a experiência de Charles Trumbal que, após recorrer a tantos caminhos para
ser uma pessoa cheia do Espírito Santo, se rendeu ao simples conhecimento de
Cristo nas Escrituras e assim descansou a sua alma. Ouçamos o que ele nos diz:
“Jesus Cristo não quer ser o nosso
ajudador: ele quer ser a nossa vida. Ele não quer que trabalhemos para Ele; mas
quer que o deixemos trabalhar através de nós, nos usando como usamos um lápis
para escrever, ou melhor ainda, usando-nos como um dos dedos de Sua mão. Quando a nossa vida for não somente de
Cristo, mas Cristo será então uma vida triunfante, porque Ele não pode falhar.
É uma vida vitoriosa, uma vida que produz frutos, uma vida de serviço. Afinal,
ser vencedor, é apenas uma parcela da nossa experiência (só dizer que é
vencedor, não basta!), devemos produzir frutos em caráter e em serviço. Se
Cristo for a nossa vida, o faremos, porque Ele não pode negar-se a Si mesmo. Ele
veio para servir e não para ser servido. Um completo e novo tipo de serviço
será nosso agora, à medida que deixarmos Cristo servir outros, através de nós,
usando-nos. E este frutificar e servir, habitual e constante, deve ser todo
pela fé nEle; nosso trabalho é o resultado da sua vida em nós, e não a
condição, ou o segredo ou ainda a causa daquela vida.”
Neste
pequeno texto o Apóstolo das nações nos apresenta a singeleza de sua mensagem
cristológica. Singela em sua apresentação mas enfeitada por um conteúdo
cristológico profundo. Estas palavras ilustram o que o mesmo Paulo havia dito:
O conteúdo é colocado em vasos de barros, mas o conteúdo é excelente, pois a
excelência é Cristo (2 Co 4.7).
Caminhemos
com Paulo por estes cinco versículos e vejamos como a Primazia de Cristo na
pregação envolve a verdadeira mensagem cristã.
Este
texto nos apresenta 04 razões para que Jesus tivesse a primazia na pregação de
Paulo e deve ter, também, na nossa:
I.
A MENSAGEM CRISTOLÓGICA ANUNCIA O TESTEMUNHO DE DEUS
“Eu irmãos, quando fui ter convosco,
anunciando-vos o testemunho de Deus” ( v.1 ).
Ora,
Paulo não afirma que nada faria saber entre os seus ouvintes a não ser a Jesus
Cristo e este crucificado? Então qual é a sua mensagem, o testemunho de Deus ou
o Cristo Crucificado? A resposta é simples: o testemunho que Deus dá é a
respeito de seu filho. O autor aos Hebreus entendeu isto com clareza ao afirmar
que havendo Deus, outrora falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais,
pelos profetas, nestes últimos dias, nos falou pelo filho, a quem constituiu
herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo (Hb 1.1-2).
Em sua
intervenção auditiva direta, o Pai deu testemunho a respeito do Filho: Este é o
meu filho amado em quem me comprazo (Mt 3.17). O Pai nos apresenta o seu filho.
Também o evangelista João, falando sobre o testemunho de Deus, nos orienta que
aquele que crê no Filho de Deus, tem, em si, o testemunho. Aquele que não dá
crédito a Deus o faz mentiroso, porque não crê no testemunho que Deus dá acerca
do seu Filho. E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta
vida está no seu Filho. Aquele que tem o Filho tem a vida; aquele que não tem o
Filho de Deus não tem a vida (1 Jo 5.10-12).
Então,
quando decidimos pregar a mensagem onde Cristo é apresentado como o centro de
todas as coisas, o único nome pelo qual importa que sejamos salvos, quando
apontamos para Ele na cruz do calvário, nos unimos a Deus em seu testemunho.
Não há mensagem mais gloriosa do que esta, pois o próprio Pai ao ouvir que um mensageiro
se une a Ele para dar um testemunho que é o seu, não poderá dizer outra coisa a
não ser “amém”.
E para
nos autorizar, ainda mais, a pregar sobre a centralidade de Cristo o próprio
Cristo nos ensina a encontrá-lo em toda a Escritura. No episódio familiar da
Estrada de Emaús Jesus repreende os seus discípulos por não terem observado o
que constava em todas as Escrituras. Diz o mestre: “Ó néscios e tardos de coração para crer tudo o que os profetas
disseram! E começando por Moisés,
discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava
em todas as Escrituras” (Lc 24.25-27). Não bastasse o testemunho que Deus
dá a respeito do filho, o próprio Filho nos ensina que Ele está em toda a
Bíblia, basta ler Moisés e os Profetas, e não uma parte dele, pois Ele está em
toda a Bíblia.
Permitam-me,
apenas, citar a contribuição de David Murray quanto ao fato de muitos de nós
não pregarmos a Jesus nas páginas do Antigo Testamento. Segundo ele, isto
acontece por alguns motivos:
1-
Por causa do liberalismo de alguns que não
aceitam a literalidade do Antigo Testamento.
2-
Por causa da falta de conhecimento do contexto
histórico das passagens.
3-
Por causa da ideia de que o Antigo Testamento
não é relevante para o povo de hoje em dia.
4-
Por causa da preguiça em fazer uma correlação
do Antigo com o Novo Testamento. Segundo ele o caminho do Novo Testamento está
mais bem trilhado, por isso preferimos pregar nele.
5-
Por causa da tendência de minimizar o lugar do
Filho de Deus no Antigo Testamento. Cristo está sendo excluído das muitas
passagens do Antigo Testamento e isto com a aprovação da comunidade erudita e
acadêmica. Muitos veem a Cristo como o ponto final do Antigo Testamento e não
como a sua razão de existir.
Contra
estes argumentos devemos ouvir o Senhor Jesus nos dizer:
“Examinais as Escrituras (no caso
específico o A.T), porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas
que testificam de mim” (Jo 5.39).
II.
A MENSAGEM CRISTOLÓGICA ANULA A VAIDADE HUMANA
“E foi em fraqueza, temor e grande temor
que estive entre vós” (v. 3).
A
mensagem de Jesus não depende da ostentação e linguagem de sabedoria (v.1). Não
precisamos enfeitar a mensagem da cruz com nossa capacidade pessoal, ela é pura
e simples. O mesmo Apóstolo cobrou da igreja que ela estava abandonando a
simplicidade devida a Cristo (2 Co. 11.3). O que uma mensagem pregada na força
do homem pode fazer a corações mortos? Como podemos achar que a nossa palavra,
a nossa astúcia, a nossa eloquência pode despertar uma alma que dorme em seu
pecado?
Aliás,
muitos de nós, em vez de apontar para o que a Escritura nos ensina a respeito
de Cristo, tem se seduzido por caminhos que apontam apenas para a sabedoria
humana. Muitos, que não são capazes de abrir a Palavra de Deus para buscar nela
o conselho de Deus para o seu povo, pregam baseados em palavras humanas, em
ilustrações fictícias, em conceitos seculares de gerenciamento de igreja, em
autoajuda e em filosofias que não se submeteram ao crivo de Deus.
Somente
quando o evangelho foi pregado em fraqueza, temor e grande tremor é que o poder
de Deus foi manifesto e os ouvintes foram abençoados (v.4-5). O Espírito Santo
somente se misturou com o ministério do Apóstolo Paulo quando ele se despiu da
sabedoria humana e da linguagem persuasiva. Interessante que este mesmo
espírito de poder revestiu o Diácono Estêvão quando este, tendo o seu rosto
reconhecido como se fosse um rosto de anjo, falava com tal clareza e
simplicidade que não podiam sobrepor à sabedoria e ao Espírito com que ele
falava (Atos 6.10 e 15). O Espírito Santo é cúmplice dos que confiam apenas no
poder de Deus para pregar e não em sua capacidade humana.
Observemos,
no entanto, em Estêvão que mesmo com toda simplicidade em sua pregação não foi
simplista em sua mensagem, pois descreveu grande parte do Antigo Testamento
para mostrar aos ouvintes que Jesus impregnava as páginas da Antiga Aliança.
Que
com humildade, despojados de toda vaidade humana, abrindo mão de toda sabedoria
vã, preguemos a Cristo e este crucificado.
III.
A MENSAGEM CRISTOLÓGICA GERA A FÉ SALVADORA
“Para que a vossa fé não se apoiasse em
sabedoria humana, e sim no poder de Deus” (V 5).
Conforme
J C Rilly, existem dois meios pelos quais um homem pode perder sua alma. Ele
pode perdê-la por viver e morrer sem nenhuma fé. Como um ateu, um desiludido
espiritual, um humanista que não deposita a sua fé em nada e em ninguém.
Este é um caminho seguido por muitos e com
certeza, conforme a Bíblia, não pode agradar a Deus (Hb11:6). Uma pessoa que
opta por este
caminho perderá a sua alma.
Às
vezes uma pessoa até professa uma fé, mas vive como se não a professasse. Isto
é, a sua aparente fé não invade o seu comportamento e o seu estilo de vida. Um
bom exemplo é o homem chamado por Jesus de “louco” em Lucas 12.20, que vive de
uma maneira tão materialista que se perde eternamente.
Outra
maneira de se perder a alma é abraçando uma fé errada, não bíblica e não
salvadora. Ele pode perder sua alma por aceitar determinado tipo de fé. Ele
pode viver e morrer contentando-se com um cristianismo falso e descansando numa
esperança sem fundamento.
Este é o caminho mais comum que existe para o
inferno. Uma fé inútil é tão destruidora quanto uma ausência de fé. Ambas levam
ao mesmo destino eterno. E o que é uma fé inútil?
Uma fé
é totalmente inútil quando Jesus cristo não é o principal objeto e não ocupa o
lugar principal.
Para
muitos Jesus é apenas um “iluminado”, ou um “profeta”, ou um “espírito
evoluído”, ou mesmo um “anjo”, ou uma referência de virtude, de liderança, de
capacidade de motivação, etc.
Para alguns Ele não é Deus e muito menos
Salvador, contrariando todo o ensino bíblico que apresenta Jesus como Deus,
Senhor e Salvador (Jo 1:1; 1 João 5:20).
Existem,
portanto, muitos homens e mulheres até mesmo batizados, mas que praticamente
nada sabem sobre Cristo, Senhor e Salvador. A fé deles consiste em algumas
noções vagas e expressões vazias.
“Mas eles creem, não são
piores que outros; eles se mantêm na igreja, tentam fazer suas obrigações; não
prejudicam a ninguém; esperam que Deus seja misericordioso para com eles! Eles
confiam que o Poderoso perdoará seus pecados e os levará para o céu quando
morrerem. Isto é quase a totalidade da sua fé” J.C.Ryle.
Mas o
que estas pessoas sabem de fato sobre Cristo? Nada! Que relação experiencial
eles têm com seus ofícios e obra salvífica, seu sangue, sua justiça, sua
mediação, Seu sacerdócio, sua intercessão, sobre o novo nascimento? Elas não
receberam a Cristo em seus corações, não confessaram com sinceridade seus
pecados diante de Deus, não foram batizadas com o Espírito Santo.
Uma fé
assim não salva uma pessoa. E mesmo assim, esta é a fé de centenas de milhares
de pessoas por todo mundo que são chamadas de cristãs.
“Se você é um homem deste tipo, eu o
advirto claramente que tal cristianismo nunca o levará para o céu. Ele pode
fazer muito bem aos olhos dos homens; pode ser aprovado no conselho da igreja,
no escritório, no parlamento inglês ou nas ruas, mas ele nunca o confortará;
nunca satisfará sua consciência; nunca salvará sua alma. Eu o advirto
claramente, que todas as noções e teorias sobre Deus ser misericordioso sem
Cristo são ilusões sem fundamento e imaginações vãs. Tais teorias são puramente
ídolos da invenção humana, tanto quanto os ídolos hindus. Elas são todas da
terra, terrestres; nunca desceram do céu. O Deus do céu selou e nomeou Cristo
como o único Salvador e caminho para a vida e todos que quiserem ser salvos
devem satisfazer-se em serem salvos por Ele, do contrário, de forma alguma
serão salvos” J.C. Ryle.
Uma fé
é inteiramente inútil quando se une qualquer coisa a Cristo com respeito à
salvação da sua alma
Você
não deve somente depender de Cristo para salvação, mas deve depender de Cristo
somente e exclusivamente de Cristo. Existem multidões de homens e mulheres
batizados que professam honrar a Cristo, mas na realidade O desonram
grandemente. Eles dão a Cristo certo lugar no seu sistema religioso, mas não o
lugar que Deus tencionou que Ele ocupasse. Cristo, exclusivamente, não é “tudo
em todos” para suas almas. Não! É
Cristo e o sábado; a igreja; os sacramentos; ou ministros ou Cristo e a bondade
deles; ou Cristo e suas orações; ou Cristo e a sinceridade e
caridade deles, nas quais eles realmente descansam suas almas. Às vezes a fé
não é em Cristo, mas neles mesmos.
A
salvação é fruto de uma confiança no sacrifício de Cristo somente (Ef 2:8,9). A
purificação de nossos pecados só é possível se Cristo for o centro. Só uma
dependência exclusiva de Cristo produzirá o perdão de nossos pecados (1Jo
1:7-9).
Se
você é um cristão deste tipo, eu também o advirto claramente que sua fé é uma
ofensa a Deus. Você está mudando o plano de salvação de Deus em um plano da sua
própria invenção. De fato você está depondo Cristo do seu trono. Atente para o
que você está fazendo. Cuidado para não dar aos servos de Cristo, ou a qualquer
pessoa, ou mesmo a um anjo, a honra devida a ninguém além de Cristo. Cuidado
para não dar às ordenanças, à liturgia, a objetos, a honra devida ao Senhor.
Cuidado para não descansar o fardo de sua alma em alguma coisa a não ser Cristo
e Cristo exclusivamente. Cuidado para não ter uma fé que seja inútil e que não
pode salvar. É horrível não ter nenhuma
fé. Ter uma alma imortal confiada ao seu cuidado e negligenciá-la é terrível.
Porém, não menos terrível é estar contente com uma fé que não lhe pode fazer
nenhum bem.
Diante
de um texto tão claro assim, que Jesus tenha primazia em nossa pregação. Que
ela seja o centro de nossa música, de nossa liturgia, de nossa mensagem, de
nosso testemunho. É a pessoa e obra do Senhor Jesus que descortina diante de
nós o Velho Testamento. Como bem descreveu Edgar Andrews, as passagens
messiânicas não são icebergs flutuando no oceano do Velho testamento, antes são
ilhas, afloramentos visíveis de uma realidade profunda que dá sustentação às escrituras
do Antigo Testamento. Podemos acrescentar que ele lança luzes, um sol de
verdade sobre o Novo Testamento.
Que
nos unamos a Paulo em sua determinação: “Eu
decidi nada saber entre vós, senão a Cristo e este crucificado”. Por causa
desta determinação o evangelho da graça nos alcançou, milhões foram e serão
salvos.
Subordine
toda a sua pregação à cruz, à primazia de Cristo, à sua obra vicária, ao seu
sacrifício substitutivo, pois não existe nada mais importante para se pregar.
“Todo pregador deve pregar uma mensagem que leve à conclusão de que
Jesus Cristo é o redentor de pecadores. Eu não devo ensinar nada que não aponte
para o crucificado! Esta é uma decisão da qual ninguém deve voltar atrás: uma
decisão firme e resoluta” - Heber Carlos de Campos.