Tem sido comum ouvir pregadores, e até bons pregadores,
discorrerem sobre textos bíblicos, sem o recurso da homilética, sem dividirem o
texto em pontos principais, sem a menção da proposição, bem como as demais
regras elementares da boa pregação. Eles vão lendo o texto e dando destaques às
palavras e sentenças principais, fazendo aplicações e usando algumas
ilustrações até terminarem o sermão. Alguns, questionados sobre o não uso das
regras da homilética, apelam para a história; dizem que Calvino pregava assim.
Eu tenho uma opinião sobre a razão de alguns fazerem assim:
1-
Eles não
aprenderam bem a arte da homilética – Conheço alguns que se esforçam para
usar os recursos homiléticos, mas se esbarram nos fundamentos; têm dificuldade
em encontrar a ideia central, em estabelecer uma proposição, em usar uma
palavra chave e por fim em dividir o sermão em pontos simétricos e semânticos,
isto é, do mesmo tamanho e com a mesma natureza gramatical. Para estes, se
procurarem, sem muito esforço encontrarão auxílio nas dezenas de livros sobre o
assunto. É fácil aprender e fácil aplicar os princípios, basta um pouco de
esforço e tudo se resolve.
2-
Eles são
preguiçosos em seu preparo - Há
muita preguiça atrás da frase: Calvino pregava assim. O trabalho do pregador é
duplo: ele deve vasculhar o texto, interpretá-lo para si mesmo, descobrir a
ideia central, ver o contexto e coisas assim. Esta é apenas a primeira parte do
trabalho. Agora ele deverá sistematizar as informações, formatar os pontos para
que a congregação apreenda melhor o texto, dividir o sermão em pontos para que
utilize melhor o tempo para cada parte, estudar uma aplicação para cada ponto e
adequar ilustrações para clarificar, não para ele, mas para o ouvinte, a
mensagem pregada. O preguiçoso fica
apenas na primeira parte. Ele se convence de que se ele tiver uma boa
interpretação do texto, já está bom. Não devemos aceitar isso. Pregar um sermão usando as regras de
homilética dá mais trabalho do que tão somente discorrer o texto e destacar
partes principais, mas este é o trabalho do pregador.
3- Eles não são amorosos com os ouvintes – O uso das regras de homilética é necessário para
o pregador, pois o ajuda a usar melhor o tempo para discorrer todo o texto; no
entanto, ele é mais necessário ainda para
os ouvintes. O uso das regras da homilética ajudam na compreensão de todo o
texto pois oferece recursos didáticos para isso. O ouvinte grava melhor quando
o sermão tem pontos, proposição, palavra-chave, do que quando o pregador
simplesmente vai lendo o mesmo e discorrendo naquelas partes que ele julga
principal. Isso é falta de amor. O sermão só é bom quando ele é compreendido e
não somente quando é pregado. Sem a compreensão a mensagem não cumpre o seu
papel. Um pregador amoroso sempre se perguntará sobre a melhor forma dos seus
ouvintes entenderem bem o que ele prega. É explicito o amor de Lucas para com
Teófilo quando o escritor bíblico diz: Igualmente
a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde a sua
origem, dar-te por escrito, uma exposição em ordem para que tenhas plena
certeza das verdades em que foste instruído (Lc 1.3-4). Vejam a expressão:
Uma exposição em ordem. Isto é homilética; ou antes, isto é amor para com
Teófilo.
4- Eles não registram o que pregam – Tenho
insistido que todo pregador deve escrever todo o seu sermão. A escrita dá ao
pregador mais precisão, mais objetividade, mais controle das ilustrações e das
aplicações. Não digo que devemos ler o sermão escrito, mas registrá-lo para
melhor compreensão nossa e dos ouvintes. Sermões sem o uso das regras da
homilética são difíceis de registro. Às vezes eles não passam de anotações
soltas, difíceis de compreensão, sem objetivos, sem força. Os bons sermões
foram escritos. A história da igreja está repleta deles. Leiam os sermões de
Charles Spurgeon, Lloyd Jones, John Stott, Russel Shedd e vejam o empenho de
cada um deles em trabalhar o texto homileticamente e em registrá-lo em forma de
escrita. Um sermão escrito pode ser compartilhado, estudado em grupos pequenos,
melhorado, e muitas vezes transformados em livros. Sermões sem homilética
dificilmente podem ser registrados pois não seguem uma lógica pragmática,
dependem tão somente da elucidação de quem o fez.
São por estas razões que oriento a cada pregador a ser
estudioso, ardoroso, amoroso e criterioso ao preparar e pregar o seu sermão.
Podemos até fazer diferente, menosprezando o trabalho e não importando com a
forma com que o sermão é pregado. Quem fizer assim deverá, a seu tempo,
responder a Deus por tamanha displicência.