Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm. Todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma. (1 Co 6.12)
Nem tudo é lícito para o
cristão. O que era lícito aqui neste texto é o que o contexto nos informa:
entrar em juízo contra um irmão (1-11), ou ingerir qualquer tipo de alimento
(12-20). Matar não é lícito, nem roubar, mentir, adulterar, e assim por diante.
Este versículo tem um
princípio a nos ensinar que não a licenciosidade para tudo. Ele mostra que mesmo
quando temos a liberdade cristã para fazer algo, podemos não o fazer. Os
crentes estavam levando seus irmãos na fé a juízo e até a juízo secular. Paulo adverte
que isto, conquanto lícito, não convém. Que as demandas entre irmãos sejam
resolvidas, se possível, na igreja, e não lá fora; que se necessário haja
perdão e até prejuízo para um dos lados em vez da demanda.
Quanto à comida não há proibição no Novo
Testamento, a não ser, é claro, para animais sufocados e comidas sacrificadas a
ídolos (Atos 15.20). Possivelmente estas ordens, especialmente a primeira,
tinham a ver tão somente com os novos convertidos em um contexto de muita presença
judia na região, para não escandalizá-los.
Agora o cristão tem um
cardápio mais amplo. Comei de tudo o que se vende no mercado, disse Paulo mais
adiante (1Co 10.25). A prática de algumas religiões de proibir a ingestão de
carne de porco ou peixe sem escama, por exemplo, pode até ser útil para a
saúde, mas não tem sentido algum diante destes e de outros textos. Uma
proibição assim não passa de farisaísmo e de um jugo indevido sobre os crentes.
Mas o que de fato está
dizendo este verso das Escrituras? Está dizendo que a nossa liberdade cristã
deve ser analisada à luz de outros princípios. A pergunta que fazemos diante de
algumas possibilidades não é se eu posso, mas se eu devo fazer algo. Quais as
implicações da minha atitude? Como a minha liberdade pode trazer prejuízo a
outros irmãos? Esta é a questão.
Não seria melhor, indaga
Paulo, sofrer o prejuízo financeiro de outro irmão do que o levar a juízo? Isso
seria menos vergonhoso para a igreja. É uma derrota para a igreja uma atitude
assim, de demanda junto a juízo secular (v.5,7).
No que diz respeito a
alimentos podemos comer de tudo, no entanto, a nossa liberdade se esbarra em
outras questões apresentadas neste texto e complementadas por outros. Em
Romanos 14.21 e 22 Paulo afirma: É bom não comer carne, nem beber vinho, nem
fazer qualquer outra coisa que teu irmão venha a tropeçar ou se ofender ou se
enfraquecer. A fé que tens, tem-na para ti mesmo perante Deus. Bem-aventurado é
aquele que não se condena naquilo que aprova.
Que revelação interessante:
a nossa liberdade precisa passar pelo olhar e até pelo julgamento dos que nos
cercam. Líderes espirituais maduros são resignados em suas vontades quando se
trata de preservar mentes mais incautas e imaturas de escândalo ou tropeço.
Vejam aqui um detalhe importante
em relação ao beber vinho. A nossa geração tem uma tendência a ingerir bebida
alcóolica com mais força. Os jovens estão bebendo cada vez mais e mais cedo. Os
centros de recuperação estão cheios deles. O que nos diria Paulo nestas
circunstâncias? O mesmo que disse aos Romanos: Não faça qualquer coisa que faça
tropeçar ou ofender ou enfraquecer um noviço na fé. É simples assim. É comum
vermos, por exemplo, mulheres grávidas deixarem de ingerir certos alimentos
para não prejudicar o seu bebê. O sentido é o mesmo. Gente de Deus se preocupa
não só com o seu bem-estar, conforto e preferência, mas também com os que estão
ao seu redor e às vezes ao seu cuidado. É falta de amor não observar estes
preceitos.
A última questão levantada
por Paulo aqui, no contexto deste versículo, tem a ver com a imoralidade
sexual. Nenhum conhecedor das Escrituras
pode entender que ter relações sexuais antes ou fora do casamento pode ser algo
que não convenha, mas pode ser lícita. Não o é; não somente pelo prosseguimento
do raciocínio paulino aqui, mas também por inúmeros outros textos dele mesmo e
de outros autores bíblicos que são enfáticos em condenar qualquer tipo de
imoralidade.
Paulo está assegurando que
cuidamos do nosso corpo porque ele não é feito para a impureza (v.13). O nosso
corpo é do Senhor e exige cuidados físicos e moral. Pecar contra o corpo é
pecar contra o Senhor (v.23). A ressurreição, citada no verso 14, é a maior
prova de que Deus tem cuidado com o nosso corpo. Seremos ressuscitados em nosso
corpo, daí a necessidade de pureza pessoal, física e moral. Este corpo, diz
Paulo mais adiante, é santuário de Deus, é habitação do seu Espírito (v.19).
Não somos mais de nós mesmos, pertencemos ao Senhor. Assim, este corpo comprado
pelo Senhor, que pertence ao Senhor e será ressuscitado pelo Senhor não pode,
mesmo tendo toda a liberdade, em alguns casos, se licenciar para a prática do
pecado.
As implicações disso é que,
mesmo em alguns casos tendo a liberdade de fazer algo, devemos viver acima da
média, desejar muito mais satisfazer a Deus com o nosso corpo e vontade do que
a nós mesmos. Devemos lutar contra nossas inclinações carnais para preservar o
máximo possível a mente dos irmãos mais frágeis na fé. Que sejamos motivos de
inspiração para eles, não de escândalo. Neste ponto os líderes espirituais têm
uma responsabilidade ainda maior.
A pureza espiritual está em voga aqui. Deus
nos ama e quer ser amado, honrado e engrandecido em nosso corpo, não somente
naquilo que fazemos por meio dele, mas também no que deixamos de fazer por amor
ao Senhor.