Em uma
reunião de oração vespertina, em uma de nossas igrejas, uma anciã iniciou sua
oração. De repente, ao mesmo tempo, e em voz alta, uma moça, visitante, interrompe
a orar também. A anciã não conseguiu continuar a sua oração, devido a esta
oração paralela. A jovem também encerrou a sua, parecendo não entender o
silencia a irmã mais velha. A anciã então reiniciou a sua, a jovem da mesma
forma, ao mesmo tempo. Vendo o impasse, com muita educação, dirigi-me à jovem e
disse: Aqui em nossa igreja não oramos todos ao mesmo tempo em voz alta,
concordamos uns com os outros com o amém e oramos juntos, mas silenciosamente.
A jovem se levantou imediatamente e foi embora, infelizmente, demonstrando
bastante irritação.
Em
muitas igrejas, no entanto, orar todos ao mesmo tempo, em voz alta, tem sido
uma prática comum, especialmente onde há uma forte tendência pentecostal. Mas
isso não é algo simples de ser aceito pelos que conhecem melhor a forma de orar
oferecida pelas Escrituras. Temos nelas as
orações individuais, exemplificadas por servos de Deus como Salomão e Paulo, e
temos as orações coletivas. Estas por sua vez não apontam para um modelo onde
todos os que oram falam ao mesmo tempo. Permitam-me apresentar as razões pelas
quais as orações não devem ser feitas, em voz alta, ao mesmo tempo por um grupo
de irmãos:
1 – Não
existe nenhuma ordem ou modelo bíblico para os crentes orarem todos, ao mesmo
tempo em voz alta. Nenhuma passagem das
Escrituras corroborará com esta prática.
Nem
mesmo o texto de Atos 4.24 nos remete a este modelo. De fato, ali, todos,
unanimemente levantaram a voz em oração, no entanto houve uma só oração, e esta
é descrita no contexto. Parte da oração foi esta: Tu soberano Senhor, que
fizeste o céu, a terra, o mar e tudo o que neles há; que disseste por
intermédio do Espírito Santo, por boa de Davi, nosso pai, teu servo. Se
todos oraram juntos, cada um conforme quisesse não teríamos aqui uma oração,
mas várias. O texto, no entanto, nos informa de uma única oração. Isto também
pode significar “unanimemente”. O que devemos entender como unânime foi a
concordância com a oração, certamente com o “amém”.
Há quem cite os “clamores” de Israel, como
modelo de orações em conjunto. De fato, elas foram em conjunto inúmeros vezes,
mas elas se assemelhavam mais a gritos de socorro e misericórdia, e até
lamentos, do que orações que são repetidas, por exemplo no Novo Testamento.
Aliás, no Novo Testamento é pouco comum a prática de algo parecido como
“clamor”. O mais comum para os novos crentes era a prática de intercessões e
súplicas (Fl 4.6). Nas Epístolas, por exemplo, não há nenhuma menção a orações
onde todos as fazem, falando ao mesmo tempo.
2 - A
ordem bíblica é que usemos o “amém” para participarmos das orações dos irmãos.
Paulo, por exemplo, orienta
que até mesmo os indoutos, ouvindo as orações, tenham oportunidade de dizer
“Amém” (1 Co 14.16). No final de suas orações, descritas nas Epístolas, o
Apóstolo fazia uso da palavra “amém” (Rm 11.36; Gl 1.5; Ef 3.21).
No
Antigo Testamento o “amém” era usado frequentemente para dizer que algo era
verdadeiro e correto. Também com o
“amém” se confirmava uma oração e dava um caráter mais solene ao que estava
sendo feito (Nm 5.22; Sl 41.13; Jr 28.6).
Ainda
que seja um termo em hebraico, no Novo Testamento ele foi mentido,
especialmente nas igrejas cristãs com o significado de “sim”, ao que estava sendo
dito ou à oração que era feita. (2 Co 1.20). E ainda, conforme descreve Ernesto
Alves Muzzi, o amém equivale a uma assinatura, uma palavra empenhada,
explicando-se assim seu uso jurídico. No Novo Testamento o “amém” desempenha o papel de responso, tendo
seu lugar no culto e encontra-se no fim das orações e doxologias, sublinhando
sua importância e verdade (Rm 1.25; 9.5; 11.36; Gl 1.5; Fp 4.20 etc.). Faz
parte dos hinos entoados a Deus, às vezes junto com o Aleluia (Ap. 19.4), e é
pronunciado tanto pelo fiel como pela congregação. Acrescenta Muzzi: o “sim” da igreja faz eco ao “sim” de Deus,
sendo este “sim” o próprio Jesus Cristo, a quem o apocalipse designa como
Testemunha fiel, o Amém, o verdadeiro Amém, o Amém absoluto, sem dúvida
aludindo a uma declaração do AT (Ap 3.14 e Is 65.16).
Não é de somenos então, ouvir
atentamente a oração dos irmãos e participar dela com o “amém”, visto que
fazendo assim, a oração se torna de todos e não somente de um. Se orarmos
juntos, em voz alta, como poderemos dizer “amém”? Desta forma perderíamos as
bênçãos de fazê-lo.
3 - Na
oração é necessário considerar o irmão que ora.
A
jovem que começou a orar ao mesmo tempo que a anciã, não demonstrou respeito por
uma irmã que iniciou o seu período de devoção. Além do que ela perdeu a
oportunidade de aprender sobre a oração com uma senhora experimentada neste
mister, ou mesmo de ser alvo de suas intercessões. Como é edificante ouvir e
participar da oração de crentes maduros na fé. Ao orar ao mesmo tempo, em voz
alta, ela estava dizendo: a sua oração não é importante para mim. Eu tenho a
minha própria oração. Os crentes que não têm a paciência de acompanhar a oração
e um irmão, podem estar demonstrando, além de falta de amor, uma presunção, em
confiar tão somente em suas próprias orações. Que oportunidade maravilhosa
temos de nos unirmos aos demais irmãos para orar por seus anseios, chateações,
angústias, medos e dores. Orar assim, ouvindo e concordando é prova de amor. E
que bênção significativa temos quando somos alvos de orações intercessórias a
nosso favor. Se eu orar em voz alta, ao mesmo tempo, não terei esta maravilhosa
oportunidade de interceder e de ser alvo das intercessões.
4- É
preciso buscara unidade na oração –
Quando
oramos no mesmo ambiente, todos em voz alta, cada qual falando e não ouvindo o
irmão, não alcançamos a unidade cristã. Sem a oportunidade de ouvir e concordar
não há um propósito comum. Se todos oram ao mesmo tempo, em voz alta, como
manter unidade de propósito? Como concordar em algum objetivo para assim sermos
ouvidos pelo Senhor, conforme nos ensinou o Senhor Jesus (Mt. 18.19)? Não faz
parte da tradição cristã uma prática que parece trazer mais confusão do que
edificação. Paulo, ainda que esteja abordando especificamente o orar em
línguas, orienta que na oração os que participam precisam ter a oportunidade de
dizer “amém”. No mesmo contexto orienta que tudo na igreja deve ser feito com
decência e ordem, visto que Deus não é de confusão (1 Co 14.33,40). Que ordem
há na igreja quando todos oram ao mesmo tempo? Como isto pode ser entendido
como um culto racional (Rm 12.1)? Mesmo quando há um pedido único a ser
buscado, não parece prudente cada um levantar a voz, e cada um, a seu modo,
especificar o que se busca. Pensemos por exemplo no tempo que gastamos juntos
louvando ao Senhor. Ali todos, de maneira uníssona, cantamos juntos a mesma
música, não levando em conta as diferenças musicais de cada um. Se cada
participante do culto cantasse uma música diferente seria isto algo agradável
de se ouvir?
Também
é de se ressaltar que ao orar todos juntos, uns podem atrapalhar os outros por
serem mais expansivos. Há testemunho de pessoas que não conseguem orar quando
pessoas ao seu lado estão orando também. Meditemos sobre isso.
5 - Não
há mais espiritualidade em se orar todos juntos –
Aqui temos uma questão que
requer muita atenção. Há os que pensam que se a oração for de forma coletiva,
com mais vozes, há mais espiritualidade nela. É como se fosse uma demonstração
de força espiritual. Deus, no entanto, não se impressiona com isso. Por outro
lado, temos orações na Bíblia, feitas por uma só pessoa, acompanhada pela
congregação, que teve em Deus muita aceitação. Deus apreciou a oração de
Salomão que apresentou o povo diante dele, acompanhado por este mesmo povo, e
recebendo de Deus uma resposta positiva, a qual pode ser vista com o fato de o
Espírito Santo encher a casa (1 Rs 8.10). A oração de uma pessoa acompanhada
pelos demais com sua concordância não precisa ser considerada sem efeito
espiritual. É presunção pensar que a oração onde todos oram ao mesmo tempo
causa um impacto maior diante do Senhor. Deus não se impressionou com a prática
litúrgica da igreja de Corinto ao falar em línguas todos ao mesmo tempo. Esta
prática não teve a aprovação do Senhor. Se ali o orar em línguas deveria ser
sucessivamente, isto é, um após o outro, porque deveríamos pensar que hoje as
exigências bíblicas seriam diferentes (1 Co 14.27)?
Penso
que é importante salientar que pode parecer cansativo e enfadonho, e às vezes é
mesmo, orar da forma como a Bíblia nos orienta, ou seja, um crente ora e os
demais participam com o amém. Mas nem todos os exercícios espirituais são
fáceis. A vida cristã tem seus dias mais difíceis. Obedecer não é questão de
gosto. O importante é fazermos o que está mais perto do que as Escrituras
ensinam.
Talvez
possamos buscar formas mais eficazes para a oração enquanto obedecemos ao
modelo que o Senhor nos outorgou. A experiência cristã tem nos mostrado que a
oração pode ser mais prazerosa com um pouco de criatividade. O que não devemos,
no entanto é presumir que podemos mudar a forma bíblica de fazê-la e orar todos
ao mesmo tempo Esta forma como vimos
parece não ter amparo bíblico.